Alta dos preços: Devemos nos preocupar com um aumento da inflação em 2021?

Há uma enorme discussão no momento com relação à possibilidade de escalada da inflação brasileira em 2021. O Banco Morgan Stanley, por exemplo, elevou a estimativa de inflação ao consumidor no Brasil em 2021 para 4,2%, ante 3,3% do prognóstico anterior. Prevendo, portanto, alta acima da meta central perseguida pelo Banco Central para este ano, de 3,75%.

Nesta semana o Boletim Focus, relatório que reúne as previsões do mercado, voltou a apontar uma maior inflação para este ano. O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) — principal indicador de inflação brasileira — mostrou que a projeção subiu pela sexta vez consecutiva, saindo de 3,60% para 3,62% nesta semana. Já para 2022, a previsão se manteve estável, em 3,49%.

O ano de 2020 foi difícil…

Quando analisamos a inflação brasileira em 2020, podemos perceber que seu comportamento foi diferente se comparados o primeiro e o segundo semestre do ano. Com o primeiro tendo sido marcado pela parada total da economia, causando, então, rápida deflação medida pelo IPCA durante os meses de abril e maio, com queda de 0,31% e 0,38%, respectivamente.

Naquele momento, as cadeias de fornecedores sofreram por conta do confinamento ocasionado pelas medidas de combate ao Coronavírus. Dificultando, assim, a produção da indústria. Dessa forma, itens em falta ocasionaram escassez na economia e, consequentemente, sobrepreço.

Ao mesmo tempo que houve o prejuízo causado pelo abastecimento limitado, deu-se início ao Auxílio Emergencial, o qual trouxe impacto positivo no consumo de determinados produtos e para determinadas faixas de renda. Sendo assim, o segundo semestre apresentou um cenário diferente para a inflação, principalmente a partir de setembro, quando houve aceleração do IPCA.

Possíveis explicações?

Parte dessa alta dos preços se deu por decisão do governo brasileiro, uma vez que a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) optou por retomar em dezembro o sistema de bandeiras tarifárias, o que estava suspenso desde maio de 2020, com o objetivo de aliviar os consumidores durante a pandemia.

Esse adicional na tarifa levou a um aumento no custo da energia, impactando tanto as despesas familiares quanto empresariais. Consistindo, então, em uma tentativa de manter o repasse de preços em 2020, o que abriria espaço para uma menor inflação em 2021. É fato que a bandeira vermelha 2 motivou reajustes nas projeções do IPCA, uma vez que a energia compromete cerca de 4% do orçamento familiar.

Pode-se afirmar que essa nova bandeira tarifária fez a conta de luz subir cerca de 12% em dezembro, refletindo em uma elevação do IPCA em torno de 0,5% ponto percentual ao mês. Todavia, com a adoção da bandeira vermelha, houve uma queda das projeções. Em doze meses, o IPCA teve uma alta de 4,31%, isso, até dezembro de 2020. Inflação, esta, acima do centro da meta estipulada para 2020, de 4%.

O ano de 2021 é um caminho incerto…

equilibrio inflação 2021

Alguns pontos merecem destaque quando se fala em uma possível alta desenfreada da inflação em 2021. O desemprego gerado pela pandemia, a previsão de baixo crescimento econômico e, também, o fim do Auxílio Emergencial (em análise para prorrogação) são fatores que jogam contra essa alta. Cabe mencionar que a população brasileira de baixa renda ficou ainda mais vulnerável com o aumento dos preços dos alimentos e que o fim do auxílio pode vir a trazer um agravamento dessa situação.

Ainda assim, outros fatores contribuem para a alta da inflação neste ano. Como, por exemplo, os reajustes baseados nos índices fechados do ano de 2020, sendo os principais nos transportes em janeiro, na educação em fevereiro e nos medicamentos em abril. Essas são pressões periódicas, que com certeza afetarão a inflação logo no começo deste ano.

Além disso, tem-se a dispersão da inflação, uma vez que, embora a alta dos preços tenha se concentrado em alimentação e bebidas em um primeiro momento, houve também aumento de consumo de gasolina, o que pode ser explicado pelo fato das classes média e alta possuírem uma cesta de consumo diversificada e terem economizado dinheiro na pandemia, servindo de âncora para a inflação dado o isolamento social Com a reabertura da economia, o consumo volta por meio dessa poupança gerada, fazendo a inflação se dispersar.

Inflação, câmbio e consumo

De fato, haverá um aumento do consumo de diversas categorias, ocasionado, também, pela baixa taxa de juros, algo que não foi percebido em 2020, mas será em 2021. A tendência é de os consumidores não deixarem o dinheiro parado e anteciparem o consumo de bens duráveis e semi-duráveis.

Não se pode também esquecer a pressão inflacionária na estrutura de custos empresariais, sendo esta captada pelo aumento no preço de diversas matérias-primas medidas pelo Índice de Preços ao Produtor (IPA) da FGV (Fundação Getúlio Vargas). O repasse desse aumento aos preços finais direcionados aos consumidores está acontecendo de maneira gradual, muito por conta do receio da indústria de perder mercado no cenário de menor renda e demanda atual, o qual pode vir a se alterar ainda este ano.

Um dólar mais baixo poderia gerar um menor custo com matérias-primas e, consequentemente, preços menores aos consumidores. O último Boletim Focus projeta que o dólar tenha o valor de R$ 5,01 em 2021, sendo que a cotação deve ir abaixo dos R$ 5,00 somente em 2023, caso as expectativas se confirmem. O início da vacinação contra a Covid-19 e o fluxo positivo de capital estrangeiro para o país colaboram com as previsões do dólar americano.

Uma economia mundial mais estável, faz com que os investidores busquem ativos mais arriscados e os países emergentes, como o Brasil, tornam-se boas alternativas, algo que já é visível, podendo vir a controlar melhor a inflação.

Os porquês de uma inflação mais alta

Por enquanto, porém, devemos mencionar algumas justificativas para uma visão de inflação mais alta em 2021. Uma delas está na expectativa de que os preços das commodities se mantenham em ascensão nos próximos trimestres. Além disso, os níveis dos reservatórios para produção de energia elétrica se encontram em mínimas históricas, o que pode se traduzir em ajustes maiores nas tarifas de energia elétrica. Outra razão para o aumento de preços neste ano é a expectativa de que não haja amplas e rígidas medidas de restrição social e econômica.

Por fim, uma razão estrutural, é o entendimento de que a alta no desemprego pode não se refletir em níveis contidos nos preços dos serviços. Quanto mais as pessoas permanecem desempregadas, mais difícil é para elas voltarem ao mercado de trabalho e, como resultado, pode-se dizer que a inflação de serviços pode não despencar como sugerido pela alta ociosidade pintada pelos indicadores do mercado de trabalho.

Aumentar a Taxa Selic pode ser uma resposta do Banco Central?

O Banco Central segue atento a um possível aumento da inflação, o que também pressiona a Taxa Selic. Todavia, também observa a necessidade de manter uma política monetária mais frouxa, ou seja, com juros baixos, atuando de forma anticíclica e, dessa forma, contendo sinais de recessão como o desemprego e a queda na renda dos brasileiros.

Após o Banco Central abandonar na quarta-feira o forward guidance, então, o banco americano Morgan Stanley disse ter antecipado a previsão para o início do ciclo de alta da Selic. Sem detalhar qual era o prognóstico anterior, o banco vê agora elevação dos juros em maio, ao ritmo de 0,25 ponto percentual, com a taxa fechando este ano em 3,50% e indo a 5,50% em 2022 — perto do juro neutro estimado pelo banco (6,50%).

É importante destacar que um aumento da Selic deve ser avaliado com cautela e ser utilizado no momento correto, caso ocorra um espalhamento maior da inflação nos próximos meses. Se não for dessa maneira, poderá dificultar a recuperação de uma economia já debilitada.

Em uma economia com pouca dinâmica como a nossa e que busca ainda se recuperar das duas maiores crises da história (2015 e 2020), subir os juros da economia pode resultar em um comprometimento ainda maior, dificultando a retomada da atividade econômica em 2021. Todavia, caso as pressões inflacionárias continuem ganhando tração nos próximos meses, o Banco Central vai se ver numa situação bastante desconfortável.

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RENAN LUQUINI ECONOMISTA ECONOMIA MERCADO PLATAFORMA SETOR MOVELEIRO

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