Móveis x Imóveis: a construção civil é âncora para a retomada da economia?

Móveis x Imóveis: construção é âncora na retomada da economia?

De acordo com estimativas do FGV-IBRE em colaboração com o Instituto de Pesquisa Anamaco, o faturamento do varejo de material de construção atingiu R$ 207,4 bilhões em 2022. Esses números representam um aumento de 2,5% em relação ao ano anterior, que totalizou R$ 202,3 bilhões. A previsão de crescimento para o setor em 2023 varia entre 1% e 3%. Mas será esse um indicador favorável para a indústria moveleira? Quais são os principais pontos de conexão entre a construção civil e o setor de móveis? Como as indústrias de ambos os segmentos influenciam mutuamente?

Para compreender melhor essa interligação, a Plataforma Setor Moveleiro recorreu à Eucatex que, desde 2015, desenvolve junto com a Fundação de Dados, estudos com o intuito de explorar essa relação. Conforme as pesquisas, nos últimos quatro anos (2020 a 2023), em amostras com mais de 1.020 consumidores que realizaram reformas ou obras residenciais, em média, 58% aproveitaram essa oportunidade para adquirir móveis novos para suas residências. 

“Estamos convictos de que ambas as indústrias, de obras/reformas residenciais e moveleiras, devem se aproximar cada vez mais, contribuindo positivamente para o faturamento do varejo de materiais de construção e de móveis”, afirma Newton Guimarães, Head da Fundação de Dados. Na pesquisa realizada durante o auge do “fique em casa”, correspondente ao segundo semestre de 2020 e ao primeiro semestre de 2021, essa proporção subiu para 64,8%. No entanto, mesmo na pesquisa mais recente, conduzida em 2023, após a reabertura completa da economia, esse número permaneceu alto, alcançando 56,3%.

Newton Guimarães, Head Fundação de Dados
Newton Guimarães, Head na Fundação de Dados.

Proximidade positiva e cada vez maior com a construção

Segundo a Eucatex, a indústria da construção civil incorpora as demandas e necessidades dos consumidores. Assim, um estudo sobre os comportamentos de compra pode indicar desejos e tendências desse segmento. “Entendemos que as pesquisas com consumidores que fizeram grandes reformas e compraram móveis auxiliam as estratégias dos nossos clientes, incorporando informações qualitativas para um maior entendimento do mercado, trazendo competitividade e visão de futuro,  principal propósito da elaboração da pesquisa”, considera Andrea Krause, Consultora de Marketing e Inovação da Indústria e Revenda da Eucatex.

Com base na experiência dos últimos anos, Luiz Rigoni, diretor da Móveis Rimo, destaca que “quando a construção civil experimenta um aumento nas vendas, o nosso setor em seguida, capta bons resultados provenientes desse crescimento”, disse.

Rigoni lembra que as taxas de juros de longo prazo são favoráveis. Isso por que tendem a impulsionar o crescimento do mercado imobiliário para a classe média e baixa renda, o que, por sua vez, resulta em uma demanda futura por móveis. 

Colaboração para benefício dos consumidores

Na opinião do Head Newton Guimarães, na jornada de compra dos materiais de construção, existem pontos de convergência que podem ser melhor aproveitados pelos dois segmentos. Ele observa que, durante o processo de obra ou reforma, os consumidores são naturalmente levados a considerar a renovação da decoração. Em alguns casos até a substituição de móveis antigos que não combinam mais com seus ambientes revitalizados.

“A princípio, as melhores práticas estão em desenvolvimento nos home-centers. Inclusive, já utilizados por aproximadamente 15% dos consumidores para compra de móveis durante a realização da obra/reforma residencial. Esse número ainda está muito aquém, por exemplo, dos magazines, lojas de móveis e marceneiros. Porém, novamente, acreditamos no potencial de desenvolvimento dessa relação”, disse Newton.

Andrea Krause, Consultora de Marketing e Inovação da Indústria e Revenda da Eucatex.
Andrea Krause, Consultora de Marketing e Inovação da Indústria e Revenda da Eucatex.

Desafios e trocas de experiências bem-sucedidas

Andrea Krause destaca que os desafios enfrentados pelos setores de móveis e de construção são distintos. Por isso, pesquisar a jornada de compra dos consumidores permite avaliar os pontos críticos e as oportunidades de sinergia entre os negócios de ambos. “Uma importante reflexão que trazemos é a importância de valorizar a experiência de compra do consumidor nas lojas, com o ambiente da casa montada, valorizando as tendências dos espaços, inovação em produtos, cores e materiais, oferecendo uma experiência sensorial, visual e essencial para a decisão de compra”, afirma.

Um exemplo bem-sucedido de colaboração é a proposta disruptiva de algumas marcas de móveis online. Elas instalaram espaços dentro das lojas de materiais de construção, um modelo denominado ‘Store in Store’. “O objetivo é que a estratégia das marcas se complementem para oferecer soluções para a casa através de venda online de móveis, assim oportunidades de captação de clientes não são perdidas e sim ampliadas”, acrescenta Andrea. 

Para a Eucatex, cada vez mais há uma tendência de decoração que se reflete nos materiais comercializados em lojas de material de construção e móveis. “Estudamos a sintonia do design, decoração, estilos, cores, acabamentos e texturas para atender a um segmento de públicos diferentes, seus gostos e preferências. Cada vez mais a casa explora essa microtendência criativa no décor e interiores que se projetam nos produtos de lançamentos expostos no PDV”, disse a consultora de marketing.

Onde há um imóvel, existe a necessidade da mobília

Adeilton Pereira,sócio-administrador da ESSANTO
Adeilton Pereira, sócio-administrador da ESSANTO e vice-presidente da Abimóvel.

Onde existe um imóvel, existe a necessidade de mobília. Isso demonstra a estreita ligação entre o setor moveleiro e o setor da construção civil, tanto residencial quanto corporativo. Essa é a conclusão do sócio-administrador da E S S A N T O, VIVA e OFFICINA móveis planejados, Adeilton Pereira, também vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria do Mobiliário (Abimóvel).

Portanto, o desempenho do setor moveleiro está intrinsecamente ligado à saúde do setor da construção civil. O vice-presidente da Abimóvel explica existe um “delay”, ou seja, um intervalo entre as obras na construção civil e os lançamentos dos empreendimentos. Contudo, ainda assim, quando a construção civil vai bem, isso impacta positivamente o setor moveleiro. “Nós estamos mobiliando hoje lançamentos que ocorreram há 3 anos, mas certamente, quando o setor da construção civil vai bem, isso nos beneficia consideravelmente”, avalia.

Agilidade na retomada da economia

Na visão de Adeilton Pereira, a construção civil reage de forma mais ágil à retomada do mercado que o setor moveleiro por diversas razões. “Eu vejo a construção civil como uma cadeia produtiva mais ampla, mais forte e intensiva em mão de obra, que gera mais empregos e, por isso, recebe também mais estímulos”, disse. Ele também destaca a valorização diferenciada entre imóveis e mobiliário como um fator crucial. “Os imóveis são percebidos como ativos de maior valor, superiores ao mobiliário, porque se tornam patrimônio, e mantêm seu valor ao longo do tempo, graças a baixa depreciação e à valorização contínua no mercado”, observa. 

Portanto, além dele proporcionar o uso e o aproveitamento do bem investido, os imóveis também se valorizam ao longo do tempo. Adeilton destaca: “Nós brasileiros, temos uma percepção de que é um dos investimentos mais seguros, em função de toda a instabilidade política e econômica que vivemos no Brasil. É muito importante não só para quem adquire um imóvel para uso imediato, como também para quem está fazendo isso como forma de investimento”, considera.

Valorização dos móveis depende da união de esforços do setor

“Acredito que falta um esforço coletivo de toda a cadeia moveleira para elevar a percepção de valor de nossos produtos na mente dos consumidores, fazendo-os entender que nosso mobiliário possui valor. Talvez estejamos perdendo espaço até para itens supérfluos, ou menos essenciais, como turismo e produtos eletroeletrônicos, que têm ganhado importância em detrimento do mobiliário”, ressalta.

Adeilton cita exemplos de iniciativas coletivas para valorizar o setor, como ações de mídia e o engajamento de formadores de opinião. No entanto, ele destaca especialmente a importância da união entre os membros do setor. “Um esforço coletivo em que os empresários do setor enxerguem mais oportunidades de cooperação do que de competição e se unam em torno do objetivo de valorizar nosso produto final”, conclui.

 

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