Conseguirão as empresas brasileiras, incluindo aqui o setor moveleiro, promoverem a chamada logística reversa com 22% do que produzem até 2024? É o que propõe os novos Decretos Federais que tratam da legislação ambiental no país.
Mas, afinal, o que é logística reversa? Antes de explicarmos as mudanças em atuação, recapitulemos um pouco sobre o assunto.
Entendendo a logística reversa
Pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010), o conceito de logística reversa diz respeito a uma série de procedimentos e meios que as empresas precisam colocar em prática para recolher e dar encaminhamento aos produtos após a venda ou consumo destes. Dessa forma, reaproveitando ou destinando de forma correta os resíduos.
Na prática, trata-se de garantir que as empresas reciclem a mesma quantidade de resíduos que colocam no mercado. A responsabilidade é compartilhada por todos aqueles que fazem parte da cadeia do ciclo de vida de uma embalagem, dentro do país onde ela é fabricada e comercializada. E isso passa pelo fabricante, distribuidor e importador. Portanto, aquela frase de campanha publicitária “fazer a economia circular” se aplica bem à logística reversa.
Os Decretos Federais em vigor
Um conjunto de leis e regulamentações estaduais e nacionais sobre o tema foi aprovado nos últimos anos. Ao mesmo tempo em que o mercado nacional e internacional, além dos próprios consumidores, têm procurado por empresas que investem em produzir de forma mais sustentável.
Neste cenário, 2022 foi marcado por conquistas importantes para o fortalecimento da logística reversa no Brasil. Incluindo a publicação de três Decretos Federais que trazem avanços nos programas de coleta, triagem e reutilização de resíduos sólidos pós-consumo.
O Decreto de nº 10.936/2022 criou o Programa Nacional de Logística Reversa. Já o de nº 11.043/2022 aprovou o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PLANARES), definindo, portanto, metas de logística reversa de embalagens. E, por último, o de nº 11.044/2022 instituiu o Certificado de Crédito de Reciclagem – Recicla+, que pretende aprimorar o funcionamento dos sistemas de logística reversa, estimulando o desenvolvimento de produtos derivados de materiais recicláveis.
No Paraná, o tema não é exatamente novidade: “A indústria paranaense é pioneira quando se trata de logística reversa. O estado tem regulamentações sobre o tema desde 2012 e, desde 2020, possui uma das legislações mais modernas sobre o tema no Brasil”, destaca o Sistema Fiep. “Com os Decretos Federais de 2022, o Ministério do Meio Ambiente se posiciona, cobra do mercado, dizendo que, a partir de 1° de março de 2023, quer um relatório com todas as empresas que aderiram à uma solução coletiva e que vêm cumprindo a logística reversa”, explicou Michelle Willmers, consultora e especialista em embalagens pós-consumo, do Eureciclo, em evento virtual promovido pela Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário (ABIMÓVEL).
A Eureciclo é uma das empresas credenciadas para emitir a certificação de créditos de reciclagem. Uma forma das empresas comprovarem que estão fazendo a compensação dos produtos que colocam no meio ambiente.
Setor moveleiro: a preocupação com sustentabilidade não é de hoje
A logística reversa, com base no conceito da compensação ambiental por créditos de reciclagem, é uma opção para a indústria moveleira. Setor em que é comum o uso de materiais como plástico, papelão e isopor. “Materiais, estes, que exigem atenção e devem ser reciclados seguindo o processo de Logística Reversa aplicado à Política Nacional de Resíduos Sólidos e, mais recentemente, valendo-se também do Recicla+, que atua sob um conceito de compensação ambiental por meio de certificado de créditos de reciclagem”, enfatiza a ABIMÓVEL.
A entidade, aliás, vem trabalhando o tema por meio do Programa de Sustentabilidade do Setor do Mobiliário (SIMB). Com a gestão sustentável tornando-se ponto essencial para a consolidação de negócios, especialmente no mercado internacional, o programa oferece a oportunidade de empresas moveleiras adotarem práticas mais adequadas e em simetria com as demandas globais.
O programa, que começou em 2017, de acordo com a ABIMÓVEL, tem parceria com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) e foco tanto no diagnóstico quanto na busca das melhores práticas para cada um dos participantes do setor de base florestal, apoiando e potencializando as vantagens para as empresas que promovam maior consumo de madeira certificada de manejo florestal sustentável.
Todas as empresas que comercializam produtos com embalagens pós-consumo devem comprovar a logística reversa de, pelo menos, 20% do total de embalagens geradas junto aos órgãos ambientais de cada estado de destino dos produtos. Os Decretos Federais preveem os acordos setoriais como os que a indústria e a ABIMÓVEL vêm trabalhando.
Os desafios do Brasil
De acordo com o Panorama dos Resíduos Sólidos, da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) e o próprio Ministério do Meio Ambiente (MMA), o Brasil tem 90% do lixo coletado, mas somente 3% do resíduo é reciclado de fato.
Cerca de 80% do material passa por um dos 800 mil catadores de material reciclável do país. Isso representa um nicho de mercado e reúne uma gama de pessoas que dependem da coleta seletiva.
Dos mais de 82 milhões de toneladas de resíduos produzidos por ano no Brasil, estima-se que quase 25 milhões de toneladas são recicláveis pós-consumo. A meta é que, desse total, pelo menos 5,4 milhões de toneladas sejam recicláveis para cumprir a legislação. São justamente os 22% da meta de reciclagem no país até 2024.
O que é e como funciona o crédito de reciclagem?
Mais de 700 mil toneladas de material foram efetivamente recicladas em 2021. O número corresponde a apenas 3% do total de embalagens geradas. No entanto, neste mesmo ano, por meio da compensação de créditos de reciclagem, somaram-se mais de 200 mil toneladas. “Este total demonstra o quanto o desafio é grande”, avalia a Eureciclo.
A empresa é responsável por fazer um rastreamento da cadeia de reciclagem, gerando créditos para que as empresas comprovem que estão promovendo a logística reversa. O objetivo do trabalho é garantir a reciclagem do volume equivalente ao que as marcas colocam no mercado e dar segurança jurídica às empresas, que poderão comprovar o que estão fazendo. Ela não é a única do ramo, mas tem sido citada por especialistas, já que se tornou referência no setor na América Latina.
O conceito da compensação ambiental é mais ou menos assim: garante-se uma embalagem equivalente à do produto que foi vendido e ela é reposta. E isso conta como crédito.
Operadores, como centrais de triagem e cooperativas, então, são certificados e homologados, depois de passarem por um processo de auditoria que inclui um check-list com mais de 20 itens. Na lista estão, por exemplo, a não utilização de trabalho infantil; que esteja em conformidade com a lei; com alvará e, principalmente, que emita nota fiscal. Afinal, é por meio delas que a empresa vai prestar contas às autoridades ambientais, como Secretarias estaduais de meio ambiente e Ministério Público. Ou seja, se a central ou cooperativa estiver 100% regularizada, é incluída no sistema da Eureciclo, por exemplo.
Na outra ponta estão os fabricantes que comercializam os produtos e os consumidores que fazem o descarte da embalagem. “É nesta etapa que a cooperativa entra. Ela vai fazer a separação e vender o material para um reciclador. A partir dessa venda, esse material é cadastrado no sistema. O que comprova que a empresa tem o relatório de impacto e a emissão do documento aos órgãos ambientais”, explica Michelle. “A Eureciclo atua em em todo o país, com 275 centrais parceiras e mais de 6.500 clientes fizeram a adesão a esse sistema de rastreamento”, completa.
Além do impacto social ser de R$ 36 milhões que são repassados às centrais de triagem e às cooperativas – beneficiando mais de oito mil famílias – , o impacto ambiental, de acordo com a Eureciclo, é de mais de 600 mil toneladas de resíduos compensados.
Os três selos da sustentabilidade
São três os selos que o fabricante recebe: o primeiro e o mais básico, que é quando cumpre a meta de compensar 22% de tudo que ele comercializa. O que, na verdade, é o mínimo.
O segundo se dá quando o fabricante neutraliza o impacto ambiental. Isso quer dizer que, para cada embalagem que ele gera, compensa outra equivalente.
Já o terceiro é conquistado quando a empresa ou o fabricante é mais estruturado e pode efetivamente colaborar com o meio ambiente. Traduzindo: para cada embalagem que a empresa vende, tira duas do mercado. Ainda, segundo o Eureciclo, entre as empresas do setor moveleiro, Rudnick, Todeschini e Patrimar já aderiram ao programa.
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