O Banco Central do Brasil (BC) está atualmente debatendo maneiras de desestimular as compras parceladas sem juros, uma proposta apresentada pelas instituições financeiras. Elas alegam que esse tipo de parcelamento é a principal causa do aumento das taxas no cartão de crédito rotativo. Uma das possíveis soluções em estudo é a adoção de um modelo de parcelamento que leve em consideração o tipo de bem a ser adquirido e o prazo da operação. Bens duráveis, como móveis, poderiam ser vendidos em um número maior de parcelas do que os semiduráveis, como roupas. No entanto, o varejo tem resistido a essa proposta.
De acordo com Newton Guimarães, Head da Fundação de Dados, desestimular parcelamentos no cartão é o mesmo que desestimular reformas residenciais, e assim, consequentemente, desencorajar a aquisição de mobiliários novos. Ele afirma que “Os varejos de móveis e materiais de construção são profundamente dependentes do crédito ao consumo”.
A importância do cartão de crédito para o setor
Em uma recente análise da Fundação de Dados relacionada às obras residenciais, o uso do cartão de crédito na construção civil pode superar 70% como meio de pagamento dos consumidores. Outra pesquisa, realizada em 2022 com consumidores das classes A, B e C, indicou gastos médios em obras e/ou reformas residenciais superiores a R$ 15 mil, chegando a mais de R$ 33 mil na classe A. “O parcelamento acaba sendo fundamental para essas compras, cujos valores são bastante elevados”, considera Guimarães.
A criação de um teto para os juros do cartão
O presidente do Banco Central do Brasil (BCB), Roberto Campos Neto, destaca que cerca de 40% do consumo brasileiro é realizado por meio do cartão de crédito. Um número substancialmente maior do que nos Estados Unidos (28%) e nos mercados emergentes (15%).
Enquanto o Banco Central debate formas de regulamentar o cartão de crédito, o Congresso discute a possibilidade de aprovar um teto para os juros no cartão, semelhante ao que já existe para o cheque especial. No entanto, os bancos têm críticas em relação a essa alteração. Isso significa que, em um cenário em que mais parcelas resultam em juros mais altos para o consumidor, os desafios persistem.
Em uma nota recente, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) divulgou que o setor financeiro não tem “qualquer pretensão de acabar com as compras parceladas no cartão de crédito”. Contudo, a intenção dos bancos, segundo o comunicado, é estabelecer um novo desenho para o parcelamento, adotando um modelo que considere o tipo de bem a ser adquirido e o prazo da operação.
A extinção do rotativo do cartão
Uma das discussões em andamento é a provável extinção do rotativo do cartão. Este cobra uma taxa mensal de 15% toda vez que o consumidor paga apenas uma parte da fatura até a data de vencimento. Isto resulta em juros médios de 437% ao ano e uma alta taxa de inadimplência de 49%, segundo dados de junho do BC. No entanto, a extinção do rotativo do cartão pode não reduzir efetivamente as taxas de juros das instituições financeiras. Isto por que a competição entre elas continua sem tabelamento.
Newton Guimarães observa que, “No atual nível de juros no rotativo do cartão, reduzir a inadimplência seria como enxugar gelo, uma medida cujo impacto positivo seria dissipado rapidamente”, considera. Ele lembra os esforços do governo para reduzir a inadimplência por meio do Programa Desenrola Brasil.

Para Newton Guimarães, a solução não é tão fácil assim. “Sabemos as consequências desastrosas do intervencionismo do governo nos preços. Como no tabelamentos de produtos, serviços e, agora, juros. Isso piora a situação, simplificando soluções por decretos e afastando, por inviabilidade, às instituições financeiras”, alerta.
“O governo, atualmente, propõe um limite de juros de 100% ao ano, mediante 445,7% ao ano, no mês de julho. Porém o setor tem um prazo de 90 dias para autorregular essa questão e apresentar uma proposta para aprovação do Conselho Monetário Nacional (CMN) e Banco Central”, destacou.
Os desafios do setor e suas complexidades
A solução para esses desafios é complexa. Envolve a baixa concorrência das operações de crédito, praticamente concentradas em apenas cinco bancos. Há também a oferta excessiva de cartões pelas fintechs. Além disso, as dificuldades impostas pela legislação brasileira para as instituições recuperarem o crédito dos inadimplentes são um fator relevante. “A falta de educação financeira da população, e o próprio governo, que é o maior tomador de crédito privado do Brasil, encarecendo o restante do crédito para empresas e consumidores, entre outras possíveis razões”, por exemplo.
Por fim, é importante mencionar a tendência de crescimento do cartão da loja. Esta modalidade apresentou um aumento de 85,2% entre a pesquisa de 2021 e a de 2023. No entanto, sua participação ainda é pequena, representando apenas 10% da utilização na pesquisa mais recente.
Os cartões de crédito e parcelamento são vitais nas vendas de materiais de construção e móveis no Brasil. Enquanto o governo discute regulamentações de juros, o impacto no setor moveleiro precisa ser monitorado. A possível redução do crédito pode afetar as vendas, exigindo estratégias de adaptação por parte das empresas. A Plataforma Setor Moveleiro vai seguir acompanhando as mudanças em andamento e noticiando as implicações dessas transformações para o setor.
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